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Nuvilíneas de Lara de Paula na Primavera Pretapalavra, por Oluwa Seyi



Salve, Salve, pessoal! Como sempre, grande honra começar mais um texto e, com ele, abrir um portal. Toda escrita suficientemente emocional tem esse poder. E esta, que já ensaia a minha despedida do nosso #Pretapalavra, não poderia ser diferente. Chegando na reta final desse processo bonito e engrandecedor de curadoria, acho justo remontar a um início: meu primeiro prefácio escrito.


Hoje, trago na barra da minha saia uma das escritoras que mais motivou e motiva minha produção. E a recíproca é sensivelmente verdadeira. A literatura presenteia-me, de maneira constante, com muita coisa encantadora. Livros que me ensinam novos acessos para mim e para o mundo; escritoras e escritores que traduzem sentimentos que eu não tinha repertório e vocabulário para nomear; movimentos e trabalhos coletivos que nutrem em mim a fé no que a humanidade é capaz de imaginar e corporificar… Difícil até ser precisa enquanto falo sobre esse

edifício material, simbólico e afetivo que a literatura tem construído para e em mim. A artista sobre a qual escrevo agora é parte fundamental nisso.


Conheci Lara de Paula graças à escrita. Pela e na literatura, nos encontramos, nos conectamos e temos caminhado lado a lado. Já tínhamos sido, até início de 2021, vizinhas de página (como gosto de dizer) em duas coletâneas, e participado de um processo formativo da FLUP (Festa Literária das Periferias), mas foi durante um curso de escrita criativa online e intimista que nos aproximamos de fato. As "coincidências” que até então nos cercavam ganharam outros nomes e novos significados: eram as primeiras pedras que utilizamos para construir nossa amizade.


Poucos meses depois dessa fundação inusitada, Lara pediu que eu escrevesse o prefácio de seu primeiro livro, Nuvilíneas (Alecrim Edições, 2021), um conjunto iluminado de prosas poéticas. Eu, mesmo nunca tendo produzido um prefácio antes, não recusaria. Como escrevi então, o convite àquela escrita “deleitou o intelecto da crítica literária que sou, mas foi o coração da poeta, maior parte de mim, que o aceitou”. Aceitou e bateu feliz por ter sido eleito.



Não há uma ciência que fundamente a escolha de um nome para a produção dos paratextos de um livro, no entanto, há vários caminhos possíveis. Há quem prefira pessoas influentes que, por cederem seu tempo e suas palavras à obra, estimulam o público leitor a adquirir e ler o livro; há também quem opte por um crítico literário específico, que entende mais profundamente uma ou outra questão tocada na obra e, a partir de seu texto, fornece chaves de interpretação mais interessantes; por fim, há quem só escolha a quem simplesmente gosta, a quem sabe que lerá com dedicação e vontade, e talvez entenda aquele detalhe que só alguns olhos podem captar: creio que Lara me escolheu por este último motivo. O mesmo motivo que me fez escolhê-la também para prefaciar meu livro primogênito. Trocamos prefácio como quem troca cartas esmeradas depois de uma leitura tão esmerada quanto. E isso, posso afirmar, nem toda pessoa influente e nem todo crítico literário interessa-se em realizar.


Mergulhar em Nuvilíneas foi singular. Uma mistura original de crônicas, poemas e autorreflexões plantados e colhidos durante o afastamento social ocasionado pela pandemia. Tudo tão à flor da pele e, ao mesmo tempo, meticuloso. Também sensível e volátil, como o título da obra deixa entrever. São nuvens em linhas, linhas de nuvens, água no seu estado menos compreensível e que, no entanto, vemos acima de nós quase todos os dias de nossas vidas. Assim como essas nuvens, somos carregadas pela força e pela sutileza das palavras ventiladas por Lara.


Nascida em Sete Lagoas e residente de Belo Horizonte (MG), Lara é arqueóloga, poeta, colagista, dançarina e intermediária de vários outras formas de arte. Nesse seu primeiro livro solo publicado junto a uma editora, falou muito de si e de sua experiência com a solitude e a solidão, mas também falou de muitas e muitos de nós. O que vivemos enquanto gênero humano escancarou desigualdades e também nos lembrou de como somos feitos da mesmíssima substância, frágil e fugaz. Ler o trabalho de Lara, naquele momento, recobrou-me o sentido do fôlego e oxigenou horas estáticas. A literatura presenteia-me, de maneira constante, com muita coisa encantadora, e poder me inflar de poesia em dias tão pesados com certeza é parte desse encanto.


Bendigo seu primeiro livro, seus zines, sua HQ Por um fio (Editora Kitembo, 2021) e tudo o que Lara ainda vier a escrever. Que outros caminhos, coincidentemente ou não, permitam que caminhemos juntas e que possamos, como nesses últimos anos, nos ler mutuamente e festejar juntas cada conquista, As mãos que escolhemos para entrelaçar com nossos dedos atestam sobre nós. São elas que auxiliam na decolagem e amparam na queda. E eu não poderia estar mais feliz

com quem escolhi e me escolheu para a aventura. Marcaram-me e eu as marquei de volta, invariavelmente.


Quase quatro anos depois, alegra-me ter sido parte desse momento importante para Lara, esse voo individual, esse desabrochar literário. Alegra-me da mesma forma poder celebrar a chegada de outra primavera de Lara, que colhe, neste maio, o trigésimo girassol de sua vida. Desejo que este texto chegue à tão boa amiga (e melhor ainda artista) como vários dos outros textos que já trocamos até hoje: uma carta amorosa que se imprime no tempo e no espaço que nos acolheu e

nos aproximou.


Que cada leitora e leitor desse nosso #Pretapalavra receba o convite para conhecer a relação bonita que Lara desenvolve com a literatura (e com tantas outras artes que ela produz) e também para ler sobre suas inspirações. No nosso próximo encontro, é Lara quem nos escreve e traz as mais belas flores amarelas de seu jardim para nos ofertar e embelezar esse nosso espaço negro e feminino. Obrigada,


Lara, seja muito bem-vinda e sinta-se em casa!










Oluwa Seyi nasceu em São Paulo, na década de 90. É poeta, pesquisasora, critica literária e percussionista. Possui graduação e mestrado em Letras pela Universidade de São Paulo, e atualmente desenvolve pesquisa de doutorado também em Letras, na área de Estudos Comparados de Literaturas de Língua Portuguesa, pela mesma instituição de ensino. Seus interesses de pesquisa são a produção artística de mulheres negras e a representação da experiência afrorreligiosa nas artes. Autora do livro de poesia O que há de autêntico em uma mãe inventada (Ed. Urutau, 2022), do zine estudo poético do corpo (2021, edição independente) e da plaquete digital Poemas que atravesssam meu corpo negro & fêmeo (2024, edição independente) . Tem poemas, contos e artigos publicados em revistas e antologias literárias e acadêmicas de diversos estados do país, como Cartas para Esperança (Ed. Malê, 2022) e Cadernos Negros 44 e 45 (Ed. Quilombhoje, 2022/2024). Além da escrita literária, interessa-se em tradução de poesia e escrita para áudio-visual. Atualmente é integrante do Sarau das pretas, coletivo artístico-literário gestado por mulheres negras. Escreve desde que se recorda e não consegue imaginar a si mesma longe do lugar de produtora, apreciadora e crítica de literatura.














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