Em seus meses como curadora aqui para o blog d'A Capi, Ana Cláudia Romano Ribeiro trouxe pra gente um alargamento da antiga iniciativa - de reunir conteúdo literário -, que focava principalmente na poesia homoerótica. A mudança do título dessa série aconteceu, justamente, para que esse movimento de celebrar poetas não heteronormativos, se torne ainda mais geral em seu específico, mais abrangente em sua definição.
Para além de um "salve!" no mês do orgulho LGBTQIA+ ou de um apanhado que se define exclusivamente pelo seu nicho, o que Ana trouxe para a gente foi poesia da melhor qualidade, sejam colagens, músicas ou poemas.
O que é poesia homoerótica pra você?
Putz, não sei bem, nunca estudei o assunto de modo a pensá-lo com alguma organização sistemática e sei que a bibliografia sobre isso é imensa. Poesia homoerótica é a poesia escrita por gente homoafetiva? Poesia que tematiza o homoerotismo e não precisa, necessariamente, ser escrita por quem vive isso? Até onde um eu homoerótico consegue ser forjado por um eu não-homoerótico? Uma pessoa homoafetiva consegue escapar de representações pré-existentes? Consegue escapar ao ponto de vista patriarcal, machista, misógino, heterocentrado, por exemplo? Onde e como ficam essas coisas dentro da gente não-hétera?
Eu não tenho respostas, precisaria me debruçar sobre o tema, mas sei que as respostas serão complexas. Fazer perguntas é um bom começo, ainda que eu já tenha respondido a essa pergunta fazendo as escolhas que fiz para esta série. Escolhi autorias queer, na maior parte mulheres ou pessoas trans, que tratam de temas variados.
Quais são os poetas mais proibidões do universo da poesia homoerótica?
Não sei, de novo. Proibidão para quem? Para a pessoa que vai à biblioteca ou à livraria procurar seus proibidões? Para a pessoa que trabalha na biblioteca ou na livraria?
Proibidão talvez seja aquele título que faz a gente enrubescer, se sentir acuada, que faz a gente se sentir na obrigação de explicar por que está lendo. Tipo a Bíblia; se eu estiver lendo no ônibus, me sentiria devedora de explicações. Isso seria o proibidão pra mim.
Ainda é um tabu versar sobre sexo em poesia?
Acho que sim. É tabu versar sobre sexo homoerótico em ambiente patriarcal, hetero-normativo e misógino, que é o ambiente em que respiramos compulsoriamente em grande parte da nossa vida.
Ficou faltando indicar alguém?
Ficou. Sempre fica. Tanta gente que eu conheço e a maioria que eu ainda desconheço e nem sei onde está, ainda mais se não me restringir a poetas que versem sobre homoerotismo (mas que sejam queer). Olhando quem está próximo – porque está em cima da minha mesa de trabalho ou do braço do sofá aqui do lado – e não versa exclusivamente sobre o tema do homoerotismo vejo Natalie Diaz, Amara Moira, Angélica Freitas, Carla Diacov, Safo, Nicola Gardini, Simone Brantes. Leio sempre os poemas do Gustavo Marcasse no insta e tenho a imensa sorte de ler semanalmente poemas a cujo nascimento eu assisto do Ismar Tirelli Neto e do Rodrigo Moretti.
Ana Cláudia Romano Ribeiro escreve, pesquisa, desenha, dá aula, performa. Tudo queer.
Publicou o livro de poemas Ave, semente (Editacuja, 2021), a tradução com introdução e notas da utopia francesa A terra austral conhecida (1676) de Gabriel de Foigny (editora da Unicamp, 2011) e coeditou a revista Morus – Utopia e Renascimento. Atualmente está no prelo sua tradução com introdução e notas da Utopia (1516) de Thomas More (editora da UFPR). Traduziu também os aforismos poéticos Poteaux d’angles (Pilares de canto), de Henri Michaux, e, em projeto coletivo, a peça de teatro Le bleu de l’île (O azul da ilha), de Évelyne Trouillot. Ilustrou A princesa que conseguiu virar moça comum e As cinco Franciscas de Deise Abreu Pacheco (inéditos).
A #poesiaqueer faz parte de nosso projeto de curadorias temáticas, onde convidamos escritoras(es), tradutoras(es) e pesquisadoras(es), para indicar e refletir sobre questões do fazer literário em nossos dias. Confira outras das iniciativas em nosso blog!
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